Cultura machista: o que é, definição e exemplos


Dizem que o machismo mora nos detalhes, uma coisinha aqui, outra lá... 'isso é cultura machista'. O termo é amplo, sua definição ainda mais, como tudo aquilo que envolve a cultura e suas nuances. A cultura machista nem sempre é clara porque ela está impregnada na sociedade. Não costuma ser óbvia à primeira vista, mas tem um efeito devastador.
Entendê-la é o primeira passo para identificar e combatê-la. É por isso que neste artigo do Psicologia-Online explicamos a cultura machista: o que é, definição e exemplos. Espero que você saia daqui com a sua dúvida esclarecida!
A cultura machista na sociedade
Para entender o que é cultura machista, faz sentido tentar compreender o que é cultura. Seria ótimo, pena que não existe uma única definição ou consenso do que é cultura. Então, podemos nos arriscar a definir a cultura do machismo como a normalização da desigualdade de gênero através de estruturas culturais. Afeta a todos de tal maneira que dificulta a visualização do problema e dessas desigualdades. Em outras palavras, a cultura do machismo está impregnada na nossa sociedade, o que faz dela uma sociedade machista.
A cultura machista também pode e deve ser pensada sob uma perspectiva interseccional, ou seja, considerando outros condicionantes como consciência de raça, classe e pensamento decolonial. Quer dizer, ainda que o machismo seja uma característica comum a todas as classes sociais e etnias, ele pode se manifestar de maneira ímpar em diferentes coletivos e o que atravessa eles.
Há ainda quem afirme que machismo não é necessariamente a mesma coisa em todo contexto cultural. Um bom exemplo disso é a visão ocidental em relação a alguns aspectos da cultura islâmica. Se para alguns a possibilidade do uso do véu pode parecer um aspecto machista do islamismo, a crítica do outro lado pode vir em relação à imposição do padrão estético da depilação, por exemplo. Nesse caso, a opressão da cultura machista tem diferentes pontos de vista. É por isso que é sempre mais fácil definir o que é cultura machista quando nós a vivenciamos e sentimos essa opressão. A questão, como comentado, é que ela está impregnada e normalizada.
Cultura do machismo sob o ponto de vista psicológico
Dentro da psicologia, o artigo 'O machismo como fenômeno psicocultural', de Octavio Giral, publicado na Revista Latioamericana de Psicologia [1] define a cultura machista da seguinte maneira:
'A instituição cultural do machismo cria os modos de satisfazer o complexo de inferioridade buscando sentimentos de superioridade e de transmiti-lo de geração em geração.'
Seguindo essa lógica, o autor também explica que o modelo patriarcal impõe a cultura machista e enaltece a masculinidade. Isso é um fator que influencia a todos os envolvidos desde a infância, a partir do momento em que um menino ou uma menina são tratados de maneira diferente, mesmo que seja nos menores detalhes, visando sempre que a sua versão adulta coincida com os padrões culturais impostos para cada sexo.
O artigo apresenta um gráfico que representa de maneira visual uma hipótese de circularidade psico-cultural que explica o machismo justificando as relações pai-filho. Traduzido[1], ele defende o seguinte esquema:

Exemplos de cultura machista
Um bom exercício para identificar a cultura machista é olhar para qualquer situação e se perguntar: se fosse com um homem/mulher no lugar dessa mulher/homem a situação seria a mesma? Experimente inverter os papéis de gênero. Esse exercício vale para praticamente tudo o que envolva a cultura do machismo.
A verdade é que parte da cultura machista que muitas vezes é chamada de micro-machismo pouco tem de micro já que todos esses comportamentos afetam a todos em escala global, além dos fatores interseccionais. No contexto brasileiro, alguns exemplos de machismo na sociedade que acontecem por causa da cultura machista são:
- Acreditar que as mulheres têsm mais responsabilidade sobre as tarefas da casa e os homens sobre o trabalho fora;
- Acreditar que os homens envelhecem 'melhor' do que as mulheres;
- Assédio sexual: na rua, no trabalho, na internet em festas ou qualquer ambiente;
- Apropriar-se de ideias de alguma mulher e não dar os créditos;
- Chamar feministas de feminazi;
- Chamar alguma mulher de 'louca';
- Classificar certos trabalhos como 'coisa de homem';
- Confundir uma mulher que tem discurso assertivo com grosseria.
- Considerar que certas roupas são 'provocativas' e justificar assédio com esse comportamento;
- Cultura do estupro: normalização do estupro em diferentes contextos;
- Culpabilização da vítima;
- Crença de que a função de uma mulher dentro de um casamento é servi-lo;
- Duvidar da vítima;
- Estranhamento ao ver uma mulher fazendo algo sozinha em espaço público;
- Etiquetar comportamentos como coisas de homens e coisas de mulheres;
- Gaslighting: distorção intencional de falas ditas por alguém com a intenção de confundir e causar danos psicológicos;
- Infantilizar mulheres;
- Julgar uma pessoa porque ela se envolve sexualmente com mais de uma pessoa;
- Justificar o estresse de uma mulher como síndrome pré-menstrual ou falta de sexo;
- Mansplainning: quando um homem explica algo para uma mulher como se ela não soubesse do assunto;
- Manspreading: homens sentados com as pernas abertas no transporte público impondo a sua masculinidade e invadindo o espaço público de uma mulher;
- Manterrupting: interromper uma mulher quando ela está falando;
- Misogínia: ódio e incitação ao ódio às mulheres;
- Normalização de relacionamentos abusivos;
- Objetificação do corpo feminino nas industria cultural e publicitária;
- Pensar que a missão e desejo de toda mulheres na face da terra é ser mãe;
- Pensar que existem mulheres 'para casar';
- Piadas sobre as mulheres dirigirem mal;
- Pornografia de vingança: compartilhar e receber vídeos íntimos online e não denunciar (quem se cala está do lado do opressor);
- Preconceito contra pessoas trans e homossexuais;
- Repara muito mais no aspecto físico das mulheres do que de homens;
- Replicar estereótipos de gênero;
- Ser cúmplice dos olhares e cantadas de rua;
- Sugerir que alguma mulher foi agredida 'porque pede' ou 'porque gosta';
- Tratar meninas e mulheres como se fossem mais frágeis e sensíveis e os meninos e homens como se precisassem ser sempre durões e racionais;
- Usar o termo 'mulherzinha' de maneira pejorativa;
- Utiliza termos relacionados a homossexualidade de maneira pejorativa;
- Violência de gênero.
Convidamos às leitoras e leitores a deixarem mais exemplos nos comentários!
Como acabar com a cultura machista
Promover a igualdade de gênero através de políticas e educação com perspectiva de gênero é fundamental nessa luta, mas o pessoal é político, e cada um de nós tem a seguinte responsabilidade na luta contra a cultura do machismo:
- Identificar;
- Desconstruir;
- Não se omitir;
- Amparar;
- Denunciar;
- Militar.
1. Identifique
Como vimos, a cultura machista implica em um conjunto de ações e comportamentos que normalizam a desigualdade de gênero e dominação masculina. O passo mais importante para se livrar dela é estar consciente e saber identificá-la. Lembre-se, na dúvida, faça a inversão dos papéis de gênero e pergunte-se se ao contrário a situação seria a mesma.
2. Desconstrua
Então, é o momento de desconstruir esse pensamento e entender porque você pensa assim e porque não faz sentido. Nascemos em uma sociedade machista e vimos que a cultura do machismo está impregnada nela, por isso é mais do que natural entender que algumas coisas não são como nos ensinamos antes e mudar de opinião e comportamento.
3. Não se omita
Agora, é importante não ficar em silêncio diante da cultura do machismo acontecendo na nossa cara. Quem se cala está do lado do opressor. Manifeste-se de maneira segura sobre tal fato e as pessoas envolvidas. Acredite, conscientizando uma pessoa a mais, que seja, você está fazendo muito pelo fim da cultura do machismo.
4. Ampare
Em casos de vítimas diretas (agressões, assédios...) antes de denunciar é importante amparar a vítima caso seja necessário.
5. Denuncie
Não hesite em denunciar. Seja para a polícia, seja no grupo de amigos, tudo vai depender da situação.
6. Milite
Alie-se à luta contra a cultura machista como puder. Todos têm os seu espaço, quanto mais agentes, melhor!
Este artigo é meramente informativo, em Psicologia-Online não temos a capacidade de fazer um diagnóstico ou indicar um tratamento. Recomendamos que você consulte um psicólogo para que ele te aconselhe sobre o seu caso em particular.
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- GIRALDO, Octavio. El machismo como fenómeno psicocultural. Revista Latinoamericana de Psicología, vol. 4, núm. 3, 1972, pp. 295-309. Fundación Universitaria Konrad Lorenz. Bogotá, Colombia. Disponível em: <https://www.redalyc.org/pdf/805/80540302.pdf/>. Acesso em 19 de junho de 2020.
- CAMPOS, Ana cristina. Agência Brasil. Cultura machista está impregnada na sociedade brasileira, diz socióloga. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-03/pesquisa-do-ipea-comprova-que-cultura-machista-esta-impregnada-na-sociedade/>. Acesso em 19 de junho de 2020.
- GIRALDO, Octavio. El machismo como fenómeno psicocultural. Revista Latinoamericana de Psicología, vol. 4, núm. 3, 1972, pp. 295-309. Fundación Universitaria Konrad Lorenz. Bogotá, Colombia. Disponível em: <https://www.redalyc.org/pdf/805/80540302.pdf/>. Acesso em 19 de junho de 2020.
- MAIA, Carlos Colares et al. Influência da cultura machista na educação dos filhos e na prevenção das doenças de transmissão sexual: vozes de mães de adolescentes. Adolescência e Saúde, v. 10, n. 4, p. 17-24, 2013. Disponível em: <http://www.adolescenciaesaude.com/detalhe_artigo.asp?id=421&idioma=Espanhol/>. Acesso em 19 de junho de 2020.