Conflitos familiares

Abandono paterno: consequências e como superá-lo

 
Bryan Longo
Por Bryan Longo. 16 julho 2020
Abandono paterno: consequências e como superá-lo

O ambiente que rodeia a criança exerce um papel fundamental, já que ela está em processo de crescimento e amadurecimento psíquico, e daí vem a importância dos adultos que cumprem as funções materna e paterna. A função materna é importante desde a gestação, das primeiras interações da mãe com o bebê, oferecendo as primeiras experiências de prazer e incômodo. Assim como a função paterna, que funciona como uma corte, permitindo a separação do conjunto mãe e filho, para permitir que a criança consiga se constituir como um ser independente. A partir disto questiona-se como a ausência de um dos progenitores afeta nesta etapa vulnerável, onde está se construindo o psiquismo infantil. Neste artigo de Psicologia-Online, investigamos algumas consequências do abandono paterno e como superá-lo.

Índice

  1. Consequências psicológicas do abandono paterno
  2. Consequências de crescer com um pai ausente
  3. Como superar o abandono paterno
  4. Meu pai me abandonou e agora me procura, o que fazer?

Consequências psicológicas do abandono paterno

Arredondo (1998) dizia que o abandono paterno causa lesões psicológicas não acidentais ocasionadas pelos responsáveis pela situação, que são consequências emocionais ou sexuais, de comissão ou omissão, e que ameaçam o desenvolvimento físico, psicológico e emocional considerado normal para a criança.

Portanto, o abandono paterno pode chegar a ser como descreve Arredondo (1998): um maltrato infantil onde há abandono físico e emocional.

Em crianças ou adolescentes que foram abandonados por um ou ambos os pais, as seguintes consequências podem surgir:

  • São propensos ao abandono ou instabilidade escolar. É um dos motivos de fracasso escolar.
  • É muito difícil para eles se adaptarem ao mundo e à realidade.
  • Medo constante do abandono.
  • Comportamento agressivo com os outros.
  • Relações sociais desinibidas (por exemplo, um comportamento verbal ou físico familiar demais, recorre pouco ou nunca ao pai ou tutor encarregado, disposição para sair com adultos desconhecidos).
  • Apego reativo (muito raramente procuram consolo quando se sentem mal).
  • Pouca ou nenhuma inteligência emocional.

As pessoas que sofreram com o abandono paterno, quando crescem, com frequência apresentam as seguintes consequências na idade adulta:

1. Pouca ou nenhuma inteligência emocional

Isto é, se estressam com facilidade, raramente são assertivos (são incapazes de estabelecer limites), são pouco empáticos, possuem vocabulário emocional limitado (não sabem identificar suas emoções e definem seu estado de ânimo como bom ou ruim), predispostos à ataques límbicos (emoções à flor da pele).

2. Dificuldade de adaptação

Dificuldade para se adaptar às mudanças que surgem em sua vida (mudanças de emprego, de casa, de cidade), sofrendo muito e de forma prolongada quando estas situações aparecem. As mudanças geralmente provocam muita ansiedade.

3. Apego a objetos

Dificuldade para se desfazer de objetos materiais (veículos, celulares, livros, documentos ou qualquer outro objeto com significado especial ou não para eles). Geralmente estes objetos, na psicanálise, representam o sofrimento do abandono: projetam seu abandono e atribuem suas próprias emoções aos objetos (por exemplo, dizem que o veículo ficará muito triste quando for vendido e deixado com um estranho). Até mesmo sofrem muita ansiedade quando precisam se separar temporariamente de algum objeto (um empréstimo, por exemplo).

4. Vulnerabilidade ao vício

São pessoas com muita susceptibilidade a se viciar em qualquer uma das seguintes atividades, objetos ou pessoas: às relações amorosas, ao consumo de substâncias de uso recreativo e terapêutico, ao trabalho, ao sexo, à pornografia, à pessoas que lhes forneçam um pouco de atenção, à qualquer pessoa que represente sua figura paterna ausente, namorados e amigos.

5. Passividade nos relacionamentos

São pessoas que frequentemente se mostram muito complacentes ou condescendentes com todos (incluindo as pessoas que não conhece). Ignoram ou deixam de lado suas prioridades ou interesses para poder agradar aos outros; as pessoas próximas as descrevem como pessoas muito boas (que escutam e ajudam aos outros sem interesses próprios). É possível que este comportamento seja uma tentativa obsessiva de fazer com que nenhuma pessoa as abandone ou perca o interesse por elas.

6. Mal-estar psicológico

Frequentemente dizem se sentir vazios ou sem um propósito de vida. O seguinte artigo aborda com profundidade o tema do sentido da vida.

7. Vulnerabilidade à psicopatologia

Estatisticamente, apresentam uma probabilidade muito maior de serem diagnosticados com alguma patologia mental do que uma pessoa que não sofreu abandono paterno. Por exemplo, um transtorno do estado de ânimo, transtorno de ansiedade, do comportamento, do sono, da alimentação, de sintomas somáticos, de traumas ou relacionados a fatores de estresse ou um transtorno de personalidade.

Consequências de crescer com um pai ausente

Escutamos muitos relatos de pessoas que apresentam dificuldade em estabelecer um vínculo sadio, ou seja, uma relação de crescimento mútuo, de objetivos e comportamentos acordados de maneira prévia. Estas pessoas tornam-se especialistas em relações que as machucam, manifestando comportamentos que permitem prolongar e permanecer nelas. Estas pessoas, frequentemente, são as que foram abandonadas por um ou ambos os pais, e mesmo que este abandono tenha acontecido há muitos anos atrás (na infância), ele se continua repercutindo em sua qualidade de vida. As relações que este tipo de pessoa mantém podem coincidir com algum dos seguintes elementos:

  • Com pessoas (amigos, esposos, noivos e familiares) que anulam constantemente as suas próprias existências, ou seja, que parecem nunca os escutar, ou quase nunca são conscientes de seus interesses e colocam os seus como prioridades.
  • Com companheiros ou amigos com algum tipo de vício (substâncias e jogos).
  • Com companheiros que violam sem nenhuma restrição nem consciência os direitos dos outros.
  • Com companheiros que maltratam física e emocionalmente.
  • Com companheiros que cometem infidelidade, ou os submetem a um constante temor de que irão embora e a abandonarão.
  • Com companheiros ou amigos que também foram abandonados por um ou ambos os pais.
  • Frequentemente são pessoas muito possessivas.
  • Geralmente têm medo de perder alguma coisa.

Como superar o abandono paterno

A superação do abandono de um pai será um trabalho muito afetado pelas circunstâncias em que o abandono aconteceu. Por exemplo, a percepção não será a mesma quando o pai maltratava física e emocionalmente sua família antes de abandoná-la.

Talvez seja preciso abordar isso pela ótica da aceitação, e não da superação; a superação de algo, envolve o tratamento profissional de alguns médicos - conseguir esquecer - e sobrepor os eventos passados pelo presente, sem se importar ou evitando a premissa psicanalítica de que tudo o que aconteceu em nossa infância repercutirá em nossa vida adulta, e portanto, exige um trabalho de reelaboração do trauma causado pelo abandono.

A seguir mostraremos alguns pontos que podem servir para você se você sofreu, ou conhece alguém que sofreu, abandono paterno:

1. Tente relatar a si mesmo os momentos que você lembra com esse pai ausente

Reserve alguns minutos para que você possa ter privacidade e escutar seus pensamentos. Se há lembranças de maltrato (agressões ou insultos) de onde podem surgir emoções (raiva, ira, tristeza), é importante que você se lembre delas também; se você sente que vai chorar, maldizer ou xingar, faça. Atue da mesma forma se houver lembranças que são agradáveis, mesmo que possa parecer contraditório com o que você sente no presente.

2. Compreenda e normalize sua situação

Depois de se permitir escutar suas emoções e dar espaço às lembranças, é hora de compreende-los para se humanizar e humanizar a figura paterna que foi tão objetificada. Se você compreende que tem emoções e pode dar nome a cada uma das sensações corporais que elas geram, você começará a ter empatia. Aceitar que uma perda pode provocar tanta dor evitará que você continue minimizando ou extrapolando com todas as outras pessoas ou situações da sua vida presente.

3. Empatize com seu pai

As outras pessoas também experimentam emoções, também possuem alguma percepção cognitiva sobre elas. Provavelmente, culpamos a nós mesmos ou ao pai ausente por todos estes anos de abandono. Por exemplo, se sabemos que nosso pai, ou nossa mãe, podem ter experimentado alguma emoção de medo de não saber ou não poder ser responsável desta mudança em sua vida (filhos), sendo essa a causa do afastamento. Obviamente, este fato não justifica um abandono ou qualquer atitude de um pai, mas permite que assim compreendamos o mundo afetivo que vivemos e a assim aceitar os erros dos outros e os nossos.

4. Não procure esquecer, mas conviver com isso

Lembre-se que não sugerimos superar a perda, mas conviver com ela. É possível superar a perda de um celular, até mesmo de nosso joguinho favorito, mas superar a perda de um pai é impossível. Este ponto ressalta esta tendência a nos convencermos de que a perda de nossos pais não vai importar, e isto é construir sobre areia. É uma falsidade acreditar que algo com tamanha carga emocional pode chegar a não nos incomodar nenhum pouco.

5. Aprenda a perdoar

Progredir depois do abandono de um pai requer perdão individual e, sobretudo, familiar, e não é algo simples de alcançar. Se o ambiente constantemente mostra o lado ruim do seu pai, se você observa a sua mãe ou irmãos sofrendo muito, certamente acabará absorvendo essa dor em seu interior. Neste artigo você encontrará conselhos para aprender a perdoar.

6. Tomar consciência

Ser consciente de todos estes pontos representa um grande avanço, pois conseguiremos identificar a dor dos outros e a nossa; as emoções dos outros e as nossas.

Meu pai me abandonou e agora me procura, o que fazer?

Um pai que nos abandonou e anos depois reaparece com a intenção de estabelecer um contato, em certos casos, constitui um fator de desgaste emocional muito grande.

Aceitar novamente em nossa vida alguém que provavelmente nos machucou muito é uma decisão transcendental, e pela mesma magnitude que implica, não é algo que devemos perguntar unicamente ao travesseiro. As feridas emocionais não desaparecem com a reaparição deste pai em sua casa, muitas vezes isso até aumenta o mal-estar. Independentemente da decisão tomada sobre permitir ou não essa aproximação do pai que nos abandonou, os danos psicológicos devem ser a prioridade em ambos os casos: primeiro avaliar todas as alterações afetivas que surgirem, para então discernir e tomar uma decisão.

Este artigo é meramente informativo, em Psicologia-Online não temos a capacidade de fazer um diagnóstico ou indicar um tratamento. Recomendamos que você consulte um psicólogo para que ele te aconselhe sobre o seu caso em particular.

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Bibliografia
  • Valeria Arredondo. (1998). Maltrato infantil: elementos básicos para su comprensión. Viya del Mar. Paicabi.

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